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Histórico das eleições presidenciais do Fluminense – Parte 1.

Carlos_Santoro

Updated: Oct 25, 2022


 

Há uns 20 anos eu tive a curiosidade de pesquisar a história das eleições presidenciais do Fluminense. Não seu aspecto político, mas seu lado factual: nomes dos candidatos, números de votos que cada um recebeu a cada sufrágio, datas de votação e de posse, etc… Meu objetivo inicial era atualizar a relação de presidentes publicada nos dois volumes do História do Fluminense de Paulo Coelho Netto, já que todas os jornais e revistas da época mencionavam, para os presidentes pós-1969 (data de publicação do segundo volume do livro do Coelho Netto), apenas os anos e não as datas exatas de início e término de mandatos. Essa pesquisa acabou me sendo útil pois eu pude publicar uma relação atualizada de presidentes no livro do centenário.

Semana passada, examinando meus arquivos do Fluminense em busca de um tema para o meu post desta semana, eu me deparei com essas minhas antigas anotações sobre as eleições, e como minha pesquisa original encontrava-se incompleta, eu resolvi retomá-la, e publicar o resultado obtido aqui no blog. Não é um resultado final, pois eu não consegui obter em jornais da época a contagem do número de votos das eleições de 1925 à 1947 (justamente parte do período que eu havia deixado de pesquisar na década de 1990), e falta também descobrir por que as eleições de 1927 e 1945 não foram realizadas. Acredito que eventualmente, examinando as atas originais dessas assembleias, eu conseguirei obter as respostas que me faltam. Como o texto final ficará mais extenso do que eu imaginava, eu resolvi dividi-lo em partes, a primeira cobrindo o período que vai de 1902 até 1908, você pode ler abaixo, e ao longo das próximas semanas (no momento não sei estimar quantas) irei publicando o restante. Ao final o leitor terá a oportunidade de baixar um pequeno livreto, em formato pdf, com todo o histórico das eleições do Flu (fig. 1).


fig. 1 – Livreto com o histórico das eleições presidenciais do Fluminense.


Confesso que eu fiquei tentado a chamar este post de A gente não sabemos escolher presidente, o famoso verso da música Inútil da banda Ultraje à Rigor, não como forma de crítica ao atual ou a qualquer outro ex-presidente do Fluminense, pois não é esse o objetivo deste blog, e sim como uma brincadeira que eu faço de colocar sempre que possível um título chamativo nos meus posts de forma a atrair o interesse do leitor. Acabei optando, entretanto, pelo título mais careta, que é porém, o mais correto e é o que eu uso no livreto: Histórico das eleições presidenciais do Fluminense Football Club.



A história das eleições no Fluminense começa no próprio dia de criação do clube, em 21 de julho de 1902, quando por sugestão de João Carlos de Mello e do presidente do Flamengo, Virgílio Leite, Oscar Cox foi aclamado presidente em reunião realizada na Rua Marques de Abrantes. É curioso notar que esse foi o segundo ato praticado pelos presentes após Cox declarar o clube como fundado logo no início da reunião, o primeiro sendo a formação de duas comissões, uma para escolher um campo e outra para elaborar os estatutos, o que demonstra que o clube esteve sem comando por apenas poucos minutos! Outro ponto importante é que fora a presidência, todos os demais cargos disponíveis (vice-presidente, primeiro e segundo secretários, tesoureiro e comissão) tiveram que passar por escrutínio, sinal de que pode ter havido de fato 20 fundadores, mas Oscar Cox era sem dúvida a principal força por trás da criação do clube.

Uma vez aprovado os estatutos em outubro de 1902, ficou decidido que as eleições para os cargos de diretoria seriam anuais, realizadas através de assembleia ordinária sempre na segunda quinzena do mês de dezembro, ocasião em que a diretoria que encerrava o mandato deveria concomitantemente prestar contas do ano que terminava. Dentro desse sistema, o inglês Francis Walter foi eleito em dezembro de 1903 para comandar o clube com apenas 13 votos! Essa eleição pode ser considerada histórica por uma série de motivos. Para começar, ela foi a primeira a ser decidida por sufrágio, como têm sido desde então na história do clube. E de 1903 à 1919, como veremos adiante, por escrutínio direto, pelo sócio, que bastava estar em dia com sua mensalidade para ter direito ao voto.

A eleição de 1903 marca, também, o início de uma tradição que perduraria no Fluminense por quase meio século: a ausência de disputa política no processo eleitoral do clube. Não havia situação e oposição na escolha do presidente do Tricolor, e consequentemente, não havia também campanha política e tudo que vêm a reboque, de bom e de ruim, como militância, panfletagem, doações financeiras, discursos, debates, falsas promessas, trocas de acusações, etc… O candidato eleito era sempre candidato único, escolhido de comum acordo pelos sócios antes da eleição, que servia somente pra ratificar o nome anteriormente definido, embora volta e meia pipocasse um ou dois votos para outro candidato, sem muita explicação. O ponto fora da curva dessa história é a crise de 1911, quando de fato houve um enfrentamento político entre candidatos a uma vaga no ground committee. Por fim vale ressaltar que Francis Walter foi o único estrangeiro da história do Flu a ser eleito presidente, e os 13 votos que recebeu em 1903 – num universo de 142 sócios na época, portanto menos de 10% de comparecimento -, representam o menor número de indivíduos que já elegeram um presidente do Flu.



Francis Walter seria reeleito ainda outras seis vezes, embora de fato fossem apenas quatro, já que duas dessas eleições foram anuladas. Explico. Na Assembleia de 30 de dezembro de 1907, Antônio Vaz de Carvalho, que acabara de ser eleito vice-presidente, alegou não poder aceitar o cargo e pior, comunicou que Walter, que não se encontrava presente, também não aceitaria o seu. Outros cinco diretores eleitos, entre eles Victor Etchegaray e Félix Frias, acompanharam Vaz de Carvalho e recusaram seus cargos, alegando ter percebido que os sócios não estavam podendo votar livremente. Edwin Cox, recém-eleito capitão, chegou a afirmar que se sua escolha para comandar a equipe fosse o real motivo das renúncias ele abdicava do cargo, o que foi desmentido pelos demissionários. Devido ao adiantado da hora não foi possível realizar uma nova eleição para os cargos deixados vagos e a reunião foi suspensa.

Menos de 48 horas depois, no dia de ano novo, uma nova assembleia, em continuação a que havia sido suspensa, foi realizada. Desta feita, tudo correu sem maiores problemas, Walter, que dessa vez encontrava-se presente, foi reeleito com 36 votos e Victor Etchegaray foi escolhido capitão. No dia 10, entretanto, em uma outra assembleia, o sócio Atahualpa Guimarães alerta os presentes que a eleição passada não tinha validade, e começou a enumerar os motivos: havia sido convocada com apenas 12 horas de antecedência, deveria ter tido uma segunda convocação pois a primeira não contou com a presença de dois terços dos sócios como determinava o estatuto, o anúncio publicado não especificava o motivo da reunião, etc… Discute daqui, discute dali, e a assembleia é interrompida e sua conclusão adiada. Finalmente, no dia 16 de fevereiro, uma nova eleição é realizada e Francis Walter é, enfim, oficialmente eleito presidente para o que seria o seu último mandato. Curiosamente com os mesmos treze votos de sua primeira eleição em 1903, igualando esse recorde negativo na história do Flu, agravado pelo fato que ao final de 1907 o Fluminense tinha 238 sócios, quase o dobro de quatro anos antes.

Eleito sete vezes – só Arnaldo Guinle venceu mais eleições para presidente no Fluminense do que ele -, o inglês Francis Walter viajava com regularidade ao seu país natal. Numa época em que uma viagem de navio entre o Rio e a Europa levava mais de duas semanas, Walter acumulou mais de um ano de ausência do Brasil nos cinco anos em que esteve no comando do Fluminense. Obviamente, nessas ocasiões, assumia o vice, que foram Guilherme Guinle e Antônio Vaz de Carvalho em suas cinco gestões.

Dois outros aspectos interessantes dessas primeiras eleições do Fluminense, é que, primeiro, não havia cerimônia de posse, que por sinal era instantânea, ocorrendo simultaneamente à eleição. E segundo, que foi só no terceiro sufrágio, o de 1904, que o Fluminense foi sede da eleição. A primeira, como já mencionado, ocorreu no casarão de Horácio da Costa Santos na Rua Marques de Abrantes e a segunda no Laranjeiras Club, clube social dos ingleses, localizado no Largo do Machado, e que por muito pouco não foi o palco da fundação do Tricolor.

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